5 Minutos de leitura 24 jul 2024
pessoas se exercitando em uma sala
Trabalho Reimaginado

Experiência do colaborador no Brasil: desafios e oportunidades pós-pandemia

Por Oliver Kamakura

Sócio de Consultoria em Gestão de Pessoas da EY para o Brasil

Um sócio que se considera trainee, Oliver tem 16 anos de experiência em consultoria relacionada a pessoas pela EY.

5 Minutos de leitura 24 jul 2024

São muitas as mudanças profundas ocorridas no mercado corporativo do mundo inteiro desde a pandemia de 2020 até os dias de hoje, incluindo as novas modalidades de trabalho - como o remoto e o híbrido -, a chegada avassaladora de novas tecnologias como a IA Generativa, além das novas demandas por habilidades técnicas e comportamentais. 

Em resumo

  • Desde a pandemia de 2020, o mercado corporativo global enfrenta transformações significativas.
  • As novas modalidades de trabalho, como remoto e híbrido, e a integração de tecnologias avançadas, como IA Generativa, têm reformulado as demandas por habilidades técnicas e comportamentais.
  • Além disso, a conexão entre bem-estar e experiência do colaborador tornou-se central, influenciando diretamente a produtividade, a retenção de talentos e os resultados empresariais.
  • Diante esse cenário, os líderes enfrentam o desafio de equilibrar expectativas e realidades para otimizar tanto a satisfação quanto a eficácia organizacional.

Trabalho Reimaginado

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Euma das mais importantes transformações no universo corporativo é o crescimento de uma agenda agenda de wellbeing (bem-estar) fortemente conectada à experiência do colaborador. No presente, e já de olho no futuro, é inegável que todos esses pontos influem em temas como produtividade, retenção de talentos e até mesmo nos resultados dos negócios.

Garantir uma experiência positiva ao colaborador certamente aumentará sua motivação, seu engajamento e sua disposição para abraçar tantas demandas, reduzindo o turnover. Por isso mesmo é que hoje surgem novos desafios para as lideranças e para os liderados na delicada troca de expectativas, realidades, e das reivindicações possíveis e impossíveis para ambas as partes.

Quais seriam as oportunidades e caminhos que despontam nesse horizonte? Alguns dados da pesquisa da EY - Trabalho Reimaginado (2023) são úteis para nos dar um retrato atual e algumas pistas para o futuro. A seguir, vamos examiná-los e comentá-los, trazendo também novos insights para a conversa.   
 

Employer branding, felicidade no trabalho e NPS do colaborador

O famoso employer branding - ou marca empregadora - tem crescido como uma das principais estratégias de fortalecimento de marca das empresas em todo o mundo, com a premissa de atrair e reter os melhores talentos do mercado, ressaltando os pontos positivos, vantagens e os atrativos da empresa para os seus colaboradores por meio de ações de comunicação interna e endomarketing, entre outras táticas.

É inegável que o employer branding seja extremamente importante para a construção de equipes de alta performance, mas isso precisa estar atrelado a compreensões práticas e mais profundas, não a uma maquiagem de problemas para simular um suposto mundo perfeito.

Na mesma lógica da preocupação com a experiência do cliente, as empresas agora se preocupam em ter funcionários felizes, que funcionem como promotores, não como detratores da marca empregadora. Um bom exemplo é o NPS -  Net Promoter Score, uma metodologia que mede a satisfação de clientes com os serviços e produtos oferecidos por uma empresa; e que agora se aplica a colaboradores, considerando indicadores do ambiente de trabalho, oportunidades de crescimento; salário e benefícios; diversidade e inclusão; ferramentas tecnológicas; flexibilidade do modelo de trabalho, entre tantos outros pontos de satisfação ou insatisfação.

O fato é que a velha noção de que trabalhar não passa de uma obrigação atrelada às contas a pagar está dando lugar a uma maior demanda por realização pessoal e sentido na vida, especialmente para as gerações Y e Z. Isso não pode ser substituído por uma noção de felicidade no trabalho em que tudo se torna um grande hobby, sem responsabilidades, compromissos e engajamento real de parte a parte.

Felicidade no trabalho está, em muito, atrelada às condições de produtividade e desempenho oferecidas pela companhia ao colaborador, o que também engloba a flexibilidade dos novos modelos de trabalho, mas vai muito além disso. Felicidade é ter espaço para atingir o próprio potencial, se sentindo pertencente à cultura da empresa, e sobretudo relevante para o ecossistema e para o sucesso do negócio.

Outros aspectos a se considerar, e que têm impacto na produtividade e performance, são o bem-estar físico, emocional, social, mental e financeiro das pessoas, as condições de moradia e deslocamento diário, e o provimento de qualificação e acesso à educação por parte das empresas.

 

A experiência do colaborador no Brasil e no mundo

Chama atenção uma pesquisa conduzida no Brasil, EUA e Reino Unido pelo Gympass, que aponta que  somente 28% dos brasileiros se sentem infelizes em seus empregos. Na mesma linha, dados da Associação Nacional de Medicina do Trabalho (Anamt) apontam que aproximadamente 30% dos trabalhadores brasileiros sofrem com a Síndrome de Burnout, também conhecida como Síndrome do Esgotamento Profissional.

Um terceiro estudo, dessa vez da International Stress Management Association (Isma), revela que o Brasil chega ao segundo lugar em número de casos diagnosticados, superado apenas pelo Japão, onde 70% da população é afetada pelo problema e há, por lei, somente 10 dias anuais de férias para os trabalhadores.

De acordo com a pesquisa do Gympass, para 83% dos empregados ouvidos, trabalhar em uma empresa que prioriza o bem-estar é tão importante quanto o salário. Outro ponto é que 85% tendem a permanecer em um cargo quando o tema é valorizado pela empresa. O que será que está faltando para isso e quais são os parâmetros de bem-estar para funcionários e empregadores?

A questão da diversidade e da inclusão  

Muitas campanhas de marketing são feitas em certos momentos do ano para ressaltar que determinadas empresas são a favor da diversidade e da inclusão em diferentes âmbitos, como a igualdade racial e de gêneros, o respeito à diversidade LGBTQIAP+, pessoas com deficiência, ou mesmo sobre o combate ao etarismo. Mas, o que é falácia e o que é feito na prática?

O estudo Trabalho Reimaginado da EY - 2023 questionou empregados e empregadores sobre qual a principal ação que as empresas deveriam tomar para aumentar a diversidade e a inclusão. Entre os empregados, 21% responderam que as empresas deveriam responsabilizar seus líderes por essas métricas, garantindo que elas são prioritárias.

Na sequência (18%), vem a revisão de critérios para contratação e promoção, a fim de garantir um pipeline mais diverso. Em terceiro lugar, vem a questão da segurança psicológica, com ​​a garantia de que a cultura da empresa é segura o suficiente para que cada um expresse seu ponto de vista (16%). Entre os empregados, a percepção é praticamente igual sobre o primeiro ponto (22%), seguida pelo oferecimento de mais programas de sponsorship (17%), e o reconhecimento de vieses no local de trabalho (14%).  

Ainda de acordo com o nosso estudo, entre os empregadores, 83% acreditam que suas empresas estão dando os passos certos para garantir mais diversidade e inclusão, face a 72% entre empregados. 

Essa diferença de percepção também vale ser analisada em cada empresa para que se faça os ajustes necessários. Pesquisas, eventos para troca de experiências e programas internos de mentoria e sponsorship podem ser bons facilitadores e ainda ajudar a melhorar ainda mais esses números.

 

A agenda do wellbeing (bem-estar) na experiência do colaborador

Salas de descompressão, gincanas com brindes, festas caras no final do ano, rodadas de pizza no escritório para quem trabalha até mais tarde, vouchers de aplicativos de transporte para quem vai aos happy hours da empresa. Isoladamente, nada disso é realmente relevante na agenda do wellbeing (bem estar). Portanto, nada disso é tão importante assim na experiência do colaborador. Em primeiro lugar, felicidade e bem-estar devem estar conectados com as condições de performance e produtividade oferecidas a cada profissional.

Antes de tudo, é preciso entender se cada um está confortável em relação aos objetivos da empresa e à sua capacidade de execução, identificar o que pode estar atrapalhando, destravar gargalos e permitir que todos consigam fazer o seu melhor.

Encontrar um bom balanço entre as demandas e garantir uma boa qualidade de vida está na lista de demandas básicas da maioria das pessoas. Segundo o estudo da EY, hoje, 83% dos empregadores acreditam que seus funcionários têm uma carga de trabalho balanceada. Entretanto, 74% dos funcionários têm a mesma percepção sobre o seu volume de trabalho, denotando disparidade de percepções.

 

Os benefícios que realmente importam

Na pesquisa, também salta aos olhos que 30% dos empregadores e 39% dos empregados ouvidos pelo nosso estudo afirmam que o investimento em saúde mental é a iniciativa de wellbeing mais importante de suas empresas. Respectivamente, o bem-estar financeiro e o bem-estar físico também aparecem na sequência das prioridades para ambos os grupos.  

Em relação ao bem-estar financeiro, o estudo da EY também traz bons insights. Quando perguntados sobre qual nível de alteração em recompensas e benefícios deveria ser aplicado em suas empresas, dado o mix entre as pressões do negócio e os talentos envolvidos, 38% dos empregadores responderam que as mudanças precisam ser grandes.

Entre empregados, 33% responderam a mesma coisa, ou seja, um pouco menos - 55% deles acreditam que uma mudança moderada seria suficiente. Mas, quais seriam essas mudanças?

Para os empregadores, os principais pontos considerados seriam oferecer opções de escolha no plano de benefícios da empresa (39%), atualização de planos de saúde com mais proteção em caso de novas pandemias (32%), propiciar mais opções de escolha para os funcionários trabalharem full-time, part-time ou sob contratos específicos (28%).

Já entre os empregados, ocorre quase um empate sobre o primeiro ponto (38%), mas o segundo item é a melhoria das condições e ferramentas tecnológicas (33%), e a atualização de planos de saúde vem em terceiro lugar, com 30% das respostas.

 

Desafios e oportunidades: como melhorar a experiência do colaborador

Entre as principais queixas para a insatisfação com o trabalho estão a falta de sintonia com a vida e os gostos pessoais, má remuneração e  benefícios pouco atrativos, falta de flexibilidade em temas como os modelos de trabalho presencial, híbrido e remoto, baixo horizonte de crescimento, falta de alinhamento e clareza sobre os rumos da empresa, sentimento de desconexão entre seu papel atual e as necessidades e objetivos do negócio; expectativas irreais de desempenho e produtividade e falta de abertura e confiança nos líderes.

Somente uma parte desses problemas podem ser resolvidos com endomarketing, brindes, uma salinha com sofá & videogame para desopilar, entre outros pequenos mimos para quem trabalha até mais tarde. Essas ações podem ser benéficas, mas somente se estiverem ligadas a uma noção maior de bem-estar que tenha real impacto na experiência do consumidor. 

O resto é pura gestão e passa por ouvir e entender os sintomas da desmotivação e do desengajamento. Lideranças de todos os níveis precisam se comunicar bem, alinhar expectativas, esclarecer dúvidas e abrir espaço para que cada colaborador possa performar melhor.

Aprimorar a experiência do colaborador não passa somente por garantir atualizações tecnológicas e ferramentas adequadas de trabalho, mas também de processos, organização, gargalos e demandas. Não há uma fórmula única ou mágica para todas as empresas.

De todas as habilidades técnicas e comportamentais em voga, quais são realmente necessárias e devem ser priorizadas para cada indivíduo, cada time, cada meta anual, por exemplo? Como apoiar o colaborador na sua capacitação pessoal e profissional em busca de uma maior produtividade e do atingimento dos resultados esperados?

Como desonerar agendas extremamente ocupadas, reduzindo backlogs e focando nos compromissos e entregas que realmente importam, com prazos plausíveis de realização? Como trazer as pessoas para a tomada de decisão sem criar uma verdadeira bagunça em suas prioridades e metas? Quantos casos de burnout poderiam ser evitados todos os anos por essas ações efetivas em resposta a essas dores, sem recorrer a meras cosméticas?

Em conclusão, cada gestor, não somente em RH, precisa se fazer as perguntas acima e tentar respondê-las com sinceridade, inclusive assumindo quando ele não tem todas as respostas, e buscando entendimento transparente entre líderes e liderados para chegar a uma equação que faça sentido. Só assim será possível melhorar a experiência do colaborador na prática, notando uma felicidade verdadeira e um engajamento genuíno com o propósito da empresa, aumentando significativamente as chances de elevar a performance, bater metas e reduzir o turnover das empresas. 

Resumo

O artigo explora as profundas mudanças no ambiente de trabalho impulsionadas pela pandemia, destacando a transição para modelos de trabalho mais flexíveis e a adoção crescente de tecnologias como a IA Generativa. Discute-se a importância de alinhar o bem-estar dos colaboradores com as metas de produtividade para melhorar a retenção e os resultados. Além disso, aborda-se o papel crucial das lideranças na mediação entre as expectativas dos colaboradores e as necessidades da empresa, sugerindo que um equilíbrio bem administrado pode levar a melhorias significativas em engajamento e desempenho organizacional.

Sobre este artigo

Por Oliver Kamakura

Sócio de Consultoria em Gestão de Pessoas da EY para o Brasil

Um sócio que se considera trainee, Oliver tem 16 anos de experiência em consultoria relacionada a pessoas pela EY.