ANP: relatório discute oportunidades e traz a visão do regulador
AAgência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) publicou relatório em que comenta a perspectiva para projetos de Captura, Utilização e Armazenamento de Carbono (CCUS, do inglês, Carbon Capture, Usage and Storage), além dos desafios regulatórios para adoção dessa tecnologia[1].
Soluções de CCUS serão parte importante das estratégias corporativas para redução de suas emissões e alcance de suas metas de GEE, e avanços em tecnologias emergentes são cruciais durante a transição para uma matriz energética mais limpa.
O que é CCUS e quais seus potenciais de aplicação?
CCUS refere-se a um conjunto de técnicas para capturar[2] dióxido de carbono (CO2) diretamente do ar ou de fontes industriais, transportá-lo e utilizá-lo em processos industriais. Na aplicação industrial do CO2, o gás pode ser utilizado na fabricação de fertilizantes, na indústria alimentícia e como matéria-prima em setores como o cimenteiro ou de biocombustíveis. Caso o gás seja injetado para armazenamento em formações geológicas subterrâneas (em reservatórios depletados de óleo ou gás ou em reservatórios salinos), deve-se realizar o descomissionamento das estruturas utilizadas, recuperação da área e monitoramento. Já o transporte do CO2 pode ocorrer por oleodutos, transporte marítimo, rodoviário ou ferroviário. As aplicações possíveis são diversas e podem trazer potencial competitivo relevante, abrangendo diferentes setores.
Projetos estrangeiros que estão sendo acompanhados pela ANP
A ANP, em seu relatório, comenta que tem acompanhado o desenvolvimento de normas, incentivos e projetos em outros países. A diversidade dos projetos de CCUS desafia a criação de um marco regulatório abrangente e uma abordagem regulatória experimental pode ser mais eficaz para estimular o desenvolvimento inicial.
Nos últimos dois anos, houve um avanço significativo nas iniciativas de CCUS. Nos Estados Unidos, a Lei de Redução de Inflação (IRA) introduziu benefícios fiscais para captura e armazenamento. A União Europeia, por sua vez, tem investido em pesquisa, desenvolvimento e inovação, além de fomentar projetos de larga escala.
No Brasil, a ANP já está recebendo projetos de CCUS, sendo essencial o estabelecimento de um marco regulatório para o avanço da iniciativa. Segundo a Autarquia, embora os tradicionais modelos regulatórios da indústria do gás e da eletricidade possam ser utilizados como ponto de partida, serão exigidas diversas adaptações para que a falta de regulação não seja um obstáculo às atividades de CCUS.
CCUS no Brasil: o que já está acontecendo
A atividade de CCUS no Brasil tem se utilizado principalmente dos recursos da Lei de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (PD&I), como os da Petrobras, da FS Agrisolutions e o da Petrogal[3]:
- A Petrobras está avaliando a implantação de um hub de CCUS em Cabiúnas, que poderia incluir emissões de E&P e outras indústrias, como cimenteiras e siderúrgicas. Iniciado em 2023, abrange captura, transporte, uso, armazenamento geológico e monitoramento;
- A FS Agrisolutions está desenvolvendo um projeto de CCS acoplado à planta de bioenergia em Mato Grosso, que visa capturar todo o CO2 produzido na etapa de fermentação (previsto para 2025). Sem regulação específica no Brasil, a FS segue normas internacionais como EPA Class VI, o protocolo de CCS da Califórnia e a ISO 27914/2017;
- A Petrogal iniciou, em 2023, a captura intensiva de CO2 na indústria do cimento para produção de biocombustíveis por meio de processos termoquímicos.
Estes projetos refletem o potencial de diversos setores e os desafios técnicos e regulatórios do CCUS no Brasil.
Projetos de Lei em discussão no Brasil
A regulamentação da atividade de CCUS está em discussão nos Projetos de Lei n. 1425/2022 e 4196/2023, que abordam obrigações como o tratamento de resíduos, licenciamento ambiental e gestão técnica de poços e reservatórios, além de responsabilidade por danos ambientais. Incentivo adicional aos projetos de CCUS se dará por meio da criação de um mercado de carbono regulado (PL 182/2024). Até o momento, não foram estabelecidos mecanismos específicos para promover a atividade de CCUS, embora existam financiamentos governamentais para projetos de redução de emissões.
O modelo de negócio de hubs
O relatório da ANP constata uma evolução nos modelos de negócios de CCUS, passando de projetos integrados para uma abordagem mais descentralizada, com iniciativas focadas em etapas específicas (captura, transporte ou armazenamento). A ideia geral é que empresas atuem em parceria para redução de custos, compartilhamento de infraestrutura e integração entre emissores.
Além das empresas de óleo e gás, que tradicionalmente lideravam as atividades de CCUS, novos atores estão emergindo, especializando-se em segmentos específicos da cadeia de valor. Isso inclui infraestrutura de transporte de CO2, companhias químicas desenvolvendo tecnologias de captura e soluções de transporte e armazenamento.
Nossa visão
A gestão das emissões de carbono e de outros gases de efeito estufa continua sendo um desafio imediato para as empresas, que estão sob crescente pressão para descarbonizar suas operações. A transição para uma economia de baixo carbono envolve custos significativos e as empresas enfrentam o risco de não acessarem mercados ou serem taxadas por suas emissões, o que pode levar à perda de valor.
No contexto brasileiro, as potencialidades dos projetos de CCUS abrangem diversos setores econômicos, incluindo óleo e gás, cimenteiras, bioenergia, alimentício, químico e siderurgia. Esses setores podem se beneficiar da implementação de tecnologias de CCUS, criando sinergias comerciais e contribuindo para a redução de emissões.
Os desafios para a implementação do CCUS incluem a rigidez locacional, que pode exigir a adaptação de infraestrutura entre a captura, o transporte e o local de armazenamento; os riscos da implementação, especialmente em relação ao tipo de reservatório; a capacitação técnica para o licenciamento ambiental de empreendimentos para captura e armazenamento de carbono; a ausência de mercado de carbono regulado; e o alto CAPEX.
Além disso, há preocupações com o passivo econômico e ambiental - como o monitoramento do reservatório, quando a competência for transferida para o Estado. Por isso, é primordial garantir ambiente regulatório que propicie segurança jurídica e viabilidade econômica e ambiental para esta tecnologia.