Artigo: É preciso se preparar para ontem em relação ao risco da natureza para os negócios

5 Minutos de leitura 15 ago 2024
Por Agência EY

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5 Minutos de leitura 15 ago 2024

Por Ana Luci Grizzi, sócia da EY Brasil para Climate Change and Sustainability Services

Se você ainda está engatinhando na abordagem climática do seu negócio, sugiro acelerar o passo. Por quê? Simples: a ficha caiu globalmente e entendemos não apenas que a base da economia é a disponibilidade de capital natural (matérias-primas e insumos originados de biodiversidade e serviços ecossistêmicos), mas também que riscos climáticos são riscos de natureza.

Adicione um grão de sal a esse cenário: ao tratar de capital natural e clima, os impactos são sistêmicos, sejam eles positivos, sejam eles negativos. Alterando um elo da cadeia de valor, temos alteração em toda a cadeia (efeito cascata). Isso não é discurso de terceiro setor, isso é a nova abordagem econômico-financeira.

Em 2020, o BIS já havia desenhado a abordagem de capital natural como base da economia em seu relatório “O Cisne Verde”. Naquele mesmo ano, o Fórum Econômico Mundial publicou o relatório “Riscos Emergentes de Natureza: por que a crise envolvendo assuntos de natureza importa para os negócios e a economia?”, alertando sobre a materialidade desses fatores para os negócios.

Em 2021, a OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico) publicou dois relatórios: “Biodiversidade, Capital Natural e a Economia”, com diretrizes de políticas públicas para ministros das finanças e do meio ambiente, e o “Trabalho da OCDE em Suporte à Biodiversidade”, com análises baseadas em evidências e dados para assistir governos no desenvolvimento de políticas públicas de natureza com efetividade ambiental e econômica.

Em 2023, foi lançada a TNFD – Força-Tarefa para Reporte de Dados Financeiros de Natureza, uma prima mais nova da TCFD, baseada nos mesmos pilares (governança; estratégia; gerenciamento de riscos e impactos; e metas e métricas), dedicada a todos os temas de meio ambiente, exceto clima. Ainda em 2023, a OCDE publicou o relatório “Padrão de Supervisão para Avaliar Riscos Financeiros Relacionados à Natureza: identificando e navegando os riscos de biodiversidade”.

Em 2024, o IFRS elegeu biodiversidade, ecossistema e serviços ecossistêmicos como temas de trabalho para decidir se eles devem ser objeto de padrões de reporte, potencialmente compondo o futuro S3.

Mas a conexão de riscos climáticos com riscos de natureza no cenário financeiro é ainda mais recente: no início de julho, a NGFS – Rede para Esverdeamento do Setor Financeiro, formada por mais de cem bancos centrais, estando entre eles o Banco Central do Brasil (sim, você leu certo, não é uma organização do terceiro setor, são os chefes da política financeira global), publicou o relatório “Riscos Financeiros de Natureza: um padrão conceitual para guiar a ação dos bancos centrais e supervisores”.

Nesse relatório, a NGFS reconhece que riscos financeiros relacionados à natureza podem ter impactos macroeconômicos significativos, e o insucesso em se responsabilizar por eles, mitigá-los e adaptar-se a eles é uma fonte relevante de riscos à estabilidade financeira.

Vejamos alguns pontos esclarecedores do relatório:

1) Abordagem integrada

Ao elaborar o padrão conceitual, a NGFS integrou temas de clima e natureza, uma vez que esses dois riscos estão fortemente interconectados. Por serem mais amplos, a NGFS define que os riscos de natureza contêm os riscos climáticos.

2) Padrão principiológico de avaliação de risco

A NGFS propõe um padrão que ajude bancos centrais e supervisores a identificar e avaliar riscos financeiros de natureza que sejam materiais, além de auxiliar no desenvolvimento de políticas e ações relacionadas. Com esse propósito, a NGFS apresenta considerações que podem ser relevantes na abordagem microprudencial, macroprudencial e/ou macroeconômica (afetando estabilidade financeira ou de preços).

3) Riscos de natureza físicos e de transição

Sem reinventar a roda, a NGFS classificou os riscos de natureza como físicos (decorrentes de degradação da natureza, incluindo biodiversidade, e perda de serviços ecossistêmicos) e de transição (decorrentes de desalinhamento de atores econômicos com ações que visem proteger, restaurar e/ou reduzir impactos negativos na natureza).

4) Papel do setor financeiro

A NGFS deixa claro que o setor financeiro não é apenas responsável por negócios que geram impactos negativos na natureza, mas também desempenha papel de facilitador de tais atividades. Comentário simples para quem já navega nos riscos climáticos financeiros: é o mesmo cenário das emissões de gases de efeito estufa financiadas e facilitadas.

5) Fases de Avaliação

A NGFS propõe três fases: identificação e priorização de fontes de riscos de natureza físicos e de transição; avaliação de riscos econômicos; e avaliação de riscos de, para e no sistema financeiro.

Na largada, para identificar e priorizar riscos de natureza materiais, a NGFS destaca a relevância do olhar para o futuro (análise de cenários), específico em localização e dimensões sistêmicas da abordagem. O resultado da análise de exposição inicial indicará setores e/ou serviços ecossistêmicos mais propensos a serem fonte de riscos materiais, podendo ser priorizados como ponto de partida para as fases seguintes.

Na segunda fase, devem ser avaliados os efeitos diretos e indiretos (aqueles que cascateiam pela cadeia de valor), efeitos micro (negócios e famílias), macro (preços, produtividade, investimento, mudanças socioeconômicas, balanço fiscal, comércio, fluxo de capital, em particular afetando inflação e PIB), setoriais e regionais e viabilidade de substituição (em termos geográficos e tecnológicos).

Na terceira fase, devem ser considerados os riscos financeiros decorrentes das exposições às fontes de riscos físicos e de transição, de forma direta ou mais provavelmente via atividades financiadas.

A NGFS conclui o relatório ilustrando com dois exemplos o padrão principiológico proposto para avaliar riscos financeiros de natureza: o da Bacia do Rio Colorado (nos EUA) e da Floresta Amazônica. Para quem estava achando que natureza, Marco Global de Biodiversidade e COP16 eram temas distantes do bottom line e da Faria Lima, sugiro repensar – e rápido. Essa nova fase do jogo já foi liberada! Natureza e clima são inter-relacionados, o primeiro engloba o segundo, e ambos, como riscos financeiros, impactam a geração de valor dos negócios.

*Este artigo foi publicado inicialmente na Capital Reset.

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