Por Diogo Mac Cord, sócio-líder de infraestrutura e mercados regulados da EY
Que o Brasil investe pouco, isso é fato conhecido. Para buscar a razão, proponho duas hipóteses: a primeira sobre a falta de capital para alocar em projetos de infraestrutura e a segunda sobre a falta de projetos de infraestrutura para alocar capital. Sobre a primeira: apesar da nossa histórica baixa poupança, temos conseguido atrair um volume significativo de investimento estrangeiro direto nos últimos anos, figurando entre os principais receptores do mundo. Além disso, a possível entrada do Brasil na OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) transformaria a oferta de capital em algo virtualmente infinito pelo acesso a trilhões de dólares restritos hoje aos países que fazem parte da organização.
Testemos então a segunda: atrair investimentos não é tarefa trivial. Requer segurança jurídica e boas perspectivas de longo prazo. Felizmente, o Brasil possui um histórico positivo em parcerias com o setor privado, por meio de concessões públicas. Não à toa, os projetos oferecidos têm resultado em leilões bastante competitivos. O gargalo parece ser muito mais a velocidade com que o governo brasileiro oferece novos projetos do que a capacidade do mercado de absorvê-los.
Chegamos aqui ao princípio da impenetrabilidade: “dois corpos não podem ocupar o mesmo espaço ao mesmo tempo”. Por que isso é importante? Porque frequentemente volta a discussão de que, para aumentar a taxa de investimento no Brasil, é preciso injetar mais recursos públicos. Quem defende essa tese entende como verdadeira a primeira hipótese, e não a segunda.
Em 1996, o investimento público representava 3,7% do PIB, enquanto a Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF) — que, além de infraestrutura, compreende outros investimentos, como máquinas e equipamentos — era de 18,6%. Com o programa de privatizações e concessões que se deu nos anos seguintes, foi possível reduzir a participação pública sem comprometer a FBCF (2,8% contra 18,4% em 2001).
Em 2004, iniciou-se um novo ciclo, que começou, respectivamente, com 2,6% e 17,3%, e terminou em 2010 com 4,7% e 20,5%. Observa-se que enquanto os investimentos públicos avançaram 81% no período, a FBCF aumentou apenas 19%: o capital privado foi expulso, e o princípio da impenetrabilidade se comprovou.
Esses patamares se mantiveram na casa dos 4% e 20% até 2014, quando a crise decorrente do desajuste fiscal levou à derrubada dos investimentos públicos para 1,9% em 2017, enquanto a FBCF atingia 14,6%. Com a mais recente volta de um robusto programa de desestatização, desinvestimentos e concessões, foi possível, em 2021, observar que mesmo o investimento público tendo ficado em apenas 2,1% do PIB, a FBCF atingia 19,2%. No terceiro trimestre de 2022, esse número já alcançava 19,6% – uma recuperação surpreendente.
Assim, a injeção de capital público em setores atraentes ao privado não parece ser a melhor solução para aumentar a taxa de investimentos, e sim a oferta de mais projetos. Se o aumento do gasto, por qualquer razão, for realmente desejado, mesmo à revelia dos efeitos colaterais decorrentes de um maior déficit fiscal, parece ser mais adequado direcioná-lo a segmentos onde a atuação do setor privado costuma ser limitada, como a necessária revitalização da infraestrutura dos nossos centros urbanos.
Com isso, cria-se um “novo espaço”, em vez de disputar um já ocupado. Pragmatismo: dois corpos não devem — e nem precisam — ocupar o mesmo espaço. Ganha o Brasil, que ainda tem muito o que construir.
*Este artigo foi publicado inicialmente no Diário do Comércio e no Jornal Empresas & Negócios.