Por Marlon Jabbur, sócio-líder de Forensics and Integrity Services para América Latina Sul; Antonio Vaz, sócio da EY para Forensics and Integrity Services; Bruno Maeda e Carlos Ayres, sócios da Maeda, Ayres & Sarubbi Advogados
Garantir boas práticas de conduta corporativa tem sido uma preocupação cada vez maior, tanto no Brasil como no exterior. Diante disso, em linha com a regulamentação e as melhores práticas sobre programas de compliance, é esperado que as empresas adotem providências imediatas para a apuração de suspeitas de violações de leis e regulamentos.
Somente com uma apuração estruturada e bem conduzida, a empresa poderá avaliar e implementar medidas apropriadas. Isso inclui encerrar imediatamente eventuais práticas indevidas, identificar e punir os envolvidos e aprimorar políticas, procedimentos e controles para a mitigação de riscos de novas violações.
Em determinadas situações, a condução de uma investigação também é relevante para que a empresa possa responder adequadamente a questionamentos de autoridades públicas ou de outros stakeholders, incluindo acionistas minoritários, auditores externos, clientes, parceiros comerciais ou ainda, em casos de maior impacto ou visibilidade externa, a opinião pública e a sociedade como um todo.
No caso da Lei n° 12.846/2013 (Lei Anticorrupção), por exemplo, a investigação interna pode ser importante para que a empresa se defenda no âmbito administrativo ou judicial. A Lei Anticorrupção se baseia em um regime de responsabilidade objetiva, de modo que investigações internas que possam refutar, conforme o caso, a prática de um ilícito atribuído à empresa vêm se revelando como uma ferramenta de extrema valia na defesa da pessoa jurídica. Ademais, a Lei Anticorrupção também reconhece a cooperação da empresa como uma forma de mitigação de sanções, incluindo, mas não se limitando, na forma de acordos de leniência, sendo a investigação interna essencial para permitir que a empresa coopere plenamente.
São comuns também os casos de ações de acionistas minoritários envolvendo denúncias de fraude ou corrupção. Muitas vezes, a exposição financeira de uma class action é superior aos valores de eventuais sanções impostas por autoridades públicas. Da mesma forma, em decorrência do próprio amadurecimento de seus programas de compliance, é comum que clientes e parceiros comerciais relevantes questionem as empresas com quem fazem negócios quando surgem alegações de irregularidades, principalmente àquelas envolvendo desvios de conduta da administração e/ou atos de violações a leis e regulamentos.
Os auditores externos estão entre os stakeholders relevantes para as investigações internas. No caso de suspeitas de não-conformidades, incluindo alegações de violações legais ou fraudes, a depender das características das alegações, os auditores podem esperar que a empresa conduza uma investigação interna, cuja adequação é avaliada pelos auditores externos como condição para a emissão de relatório de auditoria sobre as demonstrações financeiras das empresas auditadas.
Em todos esses casos, é fundamental que a investigação interna tenha credibilidade. Essa credibilidade está diretamente relacionada aos seguintes aspectos: governança da investigação; independência, qualificação técnica e experiência da equipe; e adequação e abrangência do escopo e da metodologia dos trabalhos.
Uma investigação conduzida por uma equipe independente, qualificada e experiente, estruturada com uma governança adequada que permita sua execução sem interferências ou restrições e com escopo e metodologia adequadamente definidos, é a melhor forma de conferir credibilidade ao trabalho e confiança nos resultados. É também uma forma de a empresa e seus administradores demonstrarem diligência e seriedade no tratamento de possíveis violações, bem como engajamento na melhoria constante do programa de compliance da empresa.
Assim, empresas devem se atentar a tais fatores e estarem preparadas para responder às seguintes perguntas: A governança da investigação garante que os trabalhos poderão ser realizados sem interferência ou limitações? Não há vieses na condução da investigação? A equipe de investigação possui independência, qualificação técnica e experiência? O escopo da investigação e a metodologia dos trabalhos são suficientemente abrangentes e adequados?
A independência é uma das características fundamentais de uma investigação, seja ela conduzida por investigadores internos ou por equipe externa contratada pela empresa. Essa característica tem por objetivo garantir que os trabalhos de investigação sejam conduzidos de forma adequada e imparcial, bem como que a análise dos respectivos resultados reflita de forma objetiva a realidade dos fatos.
Em determinadas situações, a melhor prática de governança é que a investigação seja realizada por equipe externa e independente contratada pela empresa. Isso inclui casos que envolvam altos níveis hierárquicos em uma organização ou casos em que a investigação externa poderá vir a ser avaliada por stakeholders externos, como autoridades públicas, auditores externos ou outros terceiros.
É comum que as companhias contratem investigadores externos quando se deparam com alegações que indicam possível envolvimento de altos executivos em casos de desvio de conduta. Tais desvios de conduta podem estar ligados a violações legais e regulatórias, incluindo atos de corrupção, bem como a fraudes financeiras ou outros atos que possam ter impacto na reputação da empresa ou em sua capacidade de atuação e gestão dos negócios. Nesse sentido, além dos aspectos citados, a utilização de equipe externa especializada também poderá ser relevante em razão da complexidade da matéria investigada e da necessidade de interação com reguladores, dentre outros aspectos.
Outra questão relevante diz respeito à definição da equipe de investigação. Isso depende diretamente da alegação e de como a investigação será estruturada. É fundamental que a equipe de investigação possua o conhecimento técnico necessário para a condução dos trabalhos. Nesse contexto, além de qualificação técnica para as atividades a serem realizadas, a experiência prévia e o reconhecimento da equipe de trabalho são fatores importantes para a credibilidade da investigação.
Nas situações em que membros da alta administração estejam ou possam estar potencialmente envolvidos nas alegações, a criação de um Comitê Especial deve ser considerada, como forma de garantir a independência e imparcialidade da investigação. Os comitês devem ter autonomia para a tomada de decisões, autoridade para determinar ou viabilizar, no âmbito da empresa, todos os atos necessários à investigação; recursos adequados à condução das atividades e objetividade para a realização da investigação.
A definição do escopo e da metodologia que serão empregadas pela equipe de investigação para o desenvolvimento das atividades está entre os principais aspectos determinantes do sucesso de uma investigação. Se o escopo definido for muito restrito, há risco da investigação ser insuficiente. Em contraponto, se o escopo não for objetivo e claramente definido, a investigação pode se tornar ineficiente, arrastando-se por um longo período e desperdiçando recursos.
Ao apresentarem suas investigações internas a seus stakeholders, as empresas devem estar preparadas para justificar a governança, independência, abrangência e metodologia adotadas, proporcionando, assim, a devida sustentação e confiabilidade dos resultados alcançados.